🌻 Este post faz parte do Projeto Girassol que tem por objetivo disseminar conhecimento sobre assuntos relacionados à morte e o morrer 🌻
O luto é um processo emocional vivido por uma pessoa diante de uma perda significativa. Geralmente associamos esta perda com a morte, mas o processo de luto também pode ser vivido diante de outras perdas tais como o término de um relacionamento, de um vínculo de trabalho, de uma fase de vida, dentre outros. E, embora muito do que se estuda sobre o luto possa se aplicar a estes diferentes contextos, daremos enfoque neste texto sobre o luto da perda diante da morte.
Existem teorias que abordam algumas fases ou etapas que são vividas no processo de luto, sendo um estudo de grande referência o da psiquiatra suíça-americana, Elisabeth Kubler-Ross[1] (1926-2004), que trabalhava com pacientes com doença terminal. Este estudo elenca como etapas do processo de luto: negação, raiva, barganha, tristeza e aceitação. Sendo assim, no processo de luto a pessoa atravessa esses diferentes momentos emocionais, até chegar na aceitação, que é o momento em que se pode viver pacificamente com a perda, não havendo uma linearidade entre estas fases, nem um tempo específico para a vivência de cada fase ou para o processo.
Visão moderna do luto
Por vez, a visão mais moderna propõe uma nova forma de se compreender o processo de luto, como o que é retratado no Modelo do Processo Dual do Enfrentamento do Luto[2]. Este modelo propõe que o luto é um processo que não é vivido por estágios, mas como um caminho dual, cheio de altos e baixos, num movimento de contração e expansão, em constante oscilação e em busca de uma adaptação à vida que ganha uma nova perspectiva após a perda. Nesse sentido, o luto não é um processo que tenha fim, nem a morte algo a ser superado.
Nesse caminho pode haver dor, choro, cansaço, medo, angústia, tristeza, confusão, paz, gratidão, sensação de dever cumprido, uma mistura de emoções que atravessam e podem ser sentidas. Cada pessoa vai vivenciar o processo de luto de forma individual, e isso deve ser acolhido e respeitado. E embora geralmente marcado pela dor, vai-se compreendendo que o luto não é apenas a dor.
Ainda, nesse caminho, é comum sentir a necessidade de recolhimento, um tempo de pausa para vivenciar e elaborar todas as emoções que atravessam. Sendo assim, é importante pensarmos o luto também como um direito de ser vivido, embora infelizmente na nossa cultura da produtividade, haja tão pouco espaço para os momentos de pausa, recolhimento e reflexão que a vivência do processo de luto convoca.
O processo de luto é tido, assim, como uma travessia, com a permissão de sentir tudo o que sentir e em direção ao reconhecimento da força e potência para seguir adiante na vida, mesmo com a dor.
Rodrigo Luz, no livro Luto é outra palavra para falar de Amor: cinco formas de honrar a vida de quem vai de quem fica após uma perda, traz:
1️⃣ Honrar a vida sobrevivendo à morte do outro;
2️⃣ Honrar a memória se abrindo para todos os sentimentos do mundo;
3️⃣ Honrar o amor respeitando o próprio tempo e jeito de reaprender a viver;
4️⃣ Honrar a marca no mundo celebrando a vida que tiveram juntos;
5️⃣Honrar o legado encontrando um novo lugar para a pessoa que morreu na nossa vida.
Sendo assim, neste olhar a honra traz a ressignificação do vínculo após a perda, reaprendendo uma forma de viver, acolhendo todas as emoções e carregando a memória de tudo o que foi vivido com aquele(a) que se foi. A morte não leva embora tudo o que foi vivido, nem leva embora a relação que estabelecemos. A morte marca uma fase, uma passagem para um novo tempo, e pouco a pouco a dor vai cicatrizando, e a relação com aquele(a) que se foi encontra um novo lugar na nossa história.
No luto, assim como em tantos processos que vivemos ao longo da vida, o caminho é através, como se atravessássemos em direção a outra margem do rio. Poder contar com ajuda é de grande importância, afinal, podemos e merecemos ser apoiados ao longo da travessia. Família, amigos, terapeuta, grupos de trabalho de luto, e toda rede de apoio possível e de formas de conexão, de se sentir junto.
A psicoterapia no processo de luto é um espaço para compartilhar as emoções, com todos os movimentos de contração na dor, e expansão para a nova vida e projetos. É espaço de acolhimento, reconhecimento e desenvolvimento das próprias capacidades e da força para sustentar a dor e atravessar o processo, podendo dizer um novo Sim à Vida.
👉🏼 Se você que está lendo esse texto está passando por um processo de luto, receba meu abraço e acolhimento. Tudo o que você estiver sentindo pode e merece ser acolhido, assim como você pode e merece receber apoio na travessia. Se você que está lendo conhece alguém que esteja passando por este processo e muitas vezes não sabe o que dizer ou fazer, esteja junto, e pergunte: O que posso fazer por você? A sua presença, apoio e escuta atenta podem fazer a diferença!
Renata Miranda
Psicóloga e Psicoterapeuta sistêmica
CRP 04/34.873
Notas:
[1] Seu estudo sobre as fases do luto está abordado no livro Sobre a morte e o morrer, de 1969.
[2] Estudo desenvolvido por Margaret Stroebe e Henk Schut, ambos professores da Universidade de Utrecht, da Holanda.
Referências / Indicações de leitura:
ARANTES, Ana Cláudia Quintana. A morte é um dia que vale a pena viver. Rio de Janeiro: Sextante, 2019.
ARANTES, Ana Cláudia Quintana. Histórias lindas de morrer. Rio de Janeiro: Sextante, 2020.
KUBLER- Ross, E. Sobre a morte e o morrer: 8ª Ed.. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
LUZ, Rodrigo. Luto é outra palavra para falar de amor: Cinco formas de honrar a vida de quem vai e de quem fica após uma perda. São Paulo: Ágora, 2021.
YALOM, Irvin D; YALOM, Marilyn. Uma questão de vida e morte: Amor, perda e o que realmente importa no final. São Paulo: Planeta, 2021.